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Sistema de Monitoramento de Seca para o Brasil – Junho/2018

1- Apresentação

A seca é considerada um fenômeno natural e recorrente em algumas regiões do Brasil, principalmente na região Nordeste, sendo caracterizada como uma ameaça natural à medida que ocorre de forma intensiva e extensiva em áreas densamente povoadas, podendo resultar em desastre quando as capacidades locais são insuficientes para evitar danos significativos e perdas socioeconômicas. Considerando que o Brasil é constituído por várias regiões, onde predominam uma grande diversidade de clima, vegetação e usos do solo, é importante que se disponha de um índice de seca que considere em sua formulação múltiplas informações que identifiquem convergências das evidências das condições de seca. Tais evidências são essenciais para maior confiabilidade nas tomadas de decisões relacionadas às ações de mitigação dos impactos em diferentes regiões do Brasil. Neste contexto, o monitoramento das condições de seca para todo o território brasileiro realizado pelo Cemaden tem como premissa a robustez metodológica e análise criteriosa das fontes e resolução espaço-temporal dos dados. Neste sentido, foi criado o Índice Integrado de Seca (ISS), que é uma combinação de indicadores de seca calculados a partir de dados observacionais de precipitação e dados da condição hídrica da vegetação.

2- Dados e Métodos

Para detalhes sobre os métodos e dados utilizados para a compilação do ISS, bem como métodos de avaliação de impactos, clique aqui.

Para detalhes sobre os métodos e dados utilizados para a compilação do ISS, bem como métodos de avaliação de impactos, clique aqui.

2.1 Índice Integrado de Seca (IIS) O IIS consiste na combinação do Índice de Precipitação Padronizada (SPI) com o Índice de Suprimento de Água para a vegetação (ISACV), este estimado por sensoriamento remoto. O SPI é um índice amplamente utilizado para detectar a seca meteorológica em diversas escalas e pode ser interpretado como o número de desvios padrões nos quais a observação se afasta da média climatológica. O índice negativo representa condições de déficit hídrico, nas quais a precipitação é inferior à média climatológica, e índice positivo representa condições de excesso hídrico, que indicam precipitação superior à média histórica. Para integrar o IIS, o SPI é calculado a partir de dados observacionais de precipitação disponíveis no CEMADEN, no Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Centros Estaduais de Meteorologia. O SPI é calculado com base na formulação proposta por Mckee et al. (1993) e considerando as escalas de 3, 6 e 12 meses.

O ISACV é calculado a partir do Índice de Vegetação da Diferença Normalizada (NDVI, sigla em inglês) e da temperatura da superfície, ambos do sensor MODIS a bordo dos satélites Terra e Aqua, disponibilizadas pelo Earth Observing System (EOS/NASA). Durante período de seca, o suprimento de água no solo não atende a demanda de água para o crescimento da vegetação. Consequentemente, ocorre o fechamento dos estômatos para a redução da perda de água do dossel pela evapotranspiração, levando ao aumento da temperatura. Assim, as características de adaptação fisiológicas da vegetação se alteram em função da umidade do solo e podem ser detectadas por meio de sensores em forma de características espectrais da copa da vegetação. O ISACV indica condição de seca quando o valor do NDVI é baixo (baixa atividade fotossintética) e a temperatura da vegetação é alta (estresse hídrico). Portanto, o índice é inversamente proporcional ao conteúdo de umidade do solo é fornece uma indicação indireta do suprimento de água para a vegetação. Mais detalhes sobre o ISACV podem ser encontrados em Cunha et al. (2015).

Para a compilação do ISS, os dados de SPIs nas escalas 3, 6 e 12 e o ISACV são reclassificados e compatibilizados de forma que as classes de ambos os índices traduzam nas mesmas intensidades de seca, as quais variam de fraca à excepcional. O ISS é calculado na escala mensal e apresentado com diferentes classes para as intensidades de seca.. Uma vez que o ISS é gerado em base georeferenciada para todo o Brasil, é possível a computação desse índice em nível municipal.

2.2 Monitoramento e Modelagem Hidrológica

Diante da necessidade informações que subsidiem tomadas de decisões relacionadas às ações de mitigação dos impactos da seca em diferentes regiões do Brasil, o Cemaden vem monitorando a precipitação e a vazão em bacias hidrográficas estratégicas e simulando previsões e cenários de vazão e de volume armazenado nos reservatórios, através de atividades de modelagem hidrológica[1]. Para isso, utiliza-se o modelo PDM/Cemaden – Probability Distributed Model. Este é um modelo simplificado que utiliza como informações de entrada a precipitação e a evaporação potencial e gera informações sobre a vazão e o volume armazenado no reservatório em diversas escalas de tempo, de acordo com o esquema apresentado na Figura 1.

As previsões e os cenários de vazão são importantes para uma eficiente gestão do risco de escassez hídrica e vêm sendo divulgados em relatórios técnicos mensais disponibilizados no site do CEMADEN (Link para relatórios de Três Marias e Sistema Cantareira) e também em reuniões técnicas semanais com os Institutos responsáveis pela gestão dos recursos hídricos (p.e. Agência Nacional de Águas, Comitês de Bacias, Operador Nacional do Sistema Elétrico, Projetos de Irrigação, etc.), disponível em:

https://www.youtube.com/playlist?list=PLdDOTUuInCuwDJ8tsrVi-G5yULaOj0zRx e
https://www.youtube.com/playlist?list=PLdDOTUuInCuzUQxnqhXo1U32ndSjL1khm.

Figura 1. Esquema geral da modelagem hidrológica para a simulação da vazão das bacias hidrográficas monitoradas e do volume armazenado dos reservatórios.

[1] Conjunto de equações matemáticas com a finalidade de representar, de forma simplificada, os processos hidrológicos (precipitação, evaporação, infiltração, armazenamento e vazão) que ocorrem em uma bacia hidrográfica.

2.3 Referencias

CUNHA, A.P.M.; ALVALÁ, R.C.; NOBRE, C.A.; CARVALHO, M.A. 2015. Monitoring vegetative drought dynamics in the Brazilian semiarid region. Agricultural and Forest Meteorology. 214-215: 494-505. doi: 10.1016/j.agrformet.2015.09.010.

MCKEE, T.B.; DOESKEN, N.J.; KLEIST, J. The relationship of drought frequency and duration to time scales, In: Eighth Conference on Applied Climatology, Anaheim, California, 1993.

ZHANG R, CUARTAS LA,  CARVALHO LA DE C  DEUSDARÁ LEAL KR, MENDIONDO EM, ABE N, BIRKINSHAW S, MOHOR GS, SELUCHI ME, NOBRE CA. Season‐based rainfall–runoff modelling using the probability‐distributed model (PDM) for large basins in southeastern Brazil. Hydrological Processes. 2018 vol: 32 (14) pp: 2217-2230. https://doi.org/10.1002/hyp.13154

3- Situação atual da seca no Brasil – Junho/2018

Na figura 1 é apresentado o Índice Integrado de Secas para o Brasil referente ao mês de junho, no qual observa-se condição de seca severa principalmente nos Estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Acre. Na região Centro-Oeste, o déficit de precipitação ocorrido nos últimos meses contribuiu para a ocorrência de quebra de safra. Em outros estados também foram observados impactos nos recursos hídricos e/ou no setor agropecuário devido à ocorrência de eventos de seca nos últimos meses (e.g. Estados de Santa Catarina, São Paulo e Acre).

Na região Nordeste, observa-se condição de seca, principalmente na região que cobre a bacia do Rio Parnaíba (entre os Estados do Maranhão e Piauí) e a região do Baixo São Francisco (entre os Estados do Sergipe e Alagoas).É importante ressaltar que mesmo devido as fortes chuvas ocorridas recentemente em parte do estado do Maranhão, isso não foi suficiente para se alcançar uma normalidade climatológica. Dessa forma observa-se uma persistência de condições de seca em grande parte desse estado. Para mais informações sobre a condição de seca na Região Nordeste clique aqui

Figura 1 – Índice Integrado de Secas (IIS) para o Brasil

4- Avaliação de impactos

4.1 Impactos na Vegetação: Áreas impactadas – Vegetação com condição de estresse hídrico:

A avaliação de impactos do déficit hídrico na vegetação é realizada por meio do Índice de Suprimento de Água para a vegetação (ISACV). A condição de estresse hídrico acontece quando a água armazenada no solo é insuficiente para sustentar o crescimento vegetal. A figura 2 apresenta as áreas de uso do solo impactadas em todo o Brasil, bem como o percentual de área impactada em relação à área total de cada região. A região Nordeste é a que apresenta o maior percentual de área vegetativa com condição de estresse hídrico, totalizando cerca de 350.000 km2 (28% do NE). A região Centro-Oeste apresenta cerca de 150.000 km2 (10% do CO). A condição de seca vegetativa prolongada (por vários meses, por exemplo) pode causar impactos nas reservas hídricas superficiais e até subterrâneas, podendo ocasionar escassez hídrica. Este fenômeno refere-se às incompatibilidades da oferta hídrica (armazenamento de água) em atender todas as demanda hídricas (abastecimento público, usos industriais, irrigação, entre outros).

Figura 2 – Vegetação impactada por eventos de seca no Brasil – condição para junho de 2018.

 

4.2 Impactos Hidrológicos

A figura 3 apresenta o Índice Integrado de Seca para as regiões Sudeste e Centro-Oeste e mostra seca de fraca a moderada nas bacias afluentes aos reservatórios das UHE de Serra da Mesa (bacia do rio Tocantins-Araguaia) e de Três Marias (bacia do rio São Francisco), assim como na região do Sistema Cantareira. Estes reservatórios se encontram em situação de escassez hídrica ou de redução acentuada de sua reserva.

Figura 3 – Índice Integrado de Seca (IIS) para região Sudeste/Centro Oeste do Brasil em junho de 2018. Destaque para as bacias de drenagem das Usinas hidrelétricas de Serra da Mesa (polígono azul), Três Marias (polígono magenta) e para as bacias do Sistema Cantareira (polígono verde). A localização do exutório dos reservatórios é representada pelo símbolo do triangulo.

 

Os reservatórios do Sistema Cantareira, responsáveis pelo abastecimento de cerca de 7,5 milhões de pessoas na região metropolitana de São Paulo, encontram-se com aproximadamente 42,5% da sua reserva hídrica. Na figura 4 apresentam-se as vazões médias mensais observadas nos últimos meses e, na sequencia, cenários de vazão, em função de cenários de precipitação, para os próximos meses. No mês de Junho de 2018, a vazão média afluente a estes reservatórios foi de 11,9 m³/s, o que representa 34% da média histórica para este mês. Os cenários simulados para estes reservatórios sugerem que as vazões fiquem abaixo da média histórica para os próximos meses, ainda que as precipitações sejam em torno da média climatológica. Para mais informações da situação atual e projeções para o Sistema Cantareira clique aqui

Figura 4 – Projeções de vazão média mensal (em m³/s) afluente ao Sistema Cantareira (linhas tracejadas), para os cenários de: precipitação 50% abaixo da média climatológica (verde); precipitação 25% abaixo da média climatológica (azul claro); na média climatológica (cinza); 25% acima da média climatológica (azul escuro); e cenário crítico (período de 2013/2014) (laranja). As linhas espessas representam as vazões médias mensais observadas, de acordo com a SABESP: históricas (preto); mínimas (marrom); e série de abril de 2017 a março de 2018 (magenta); e de abril a 02 de julho de 2018 (roxo).

 

O reservatório da UHE de Três Marias, localizado na porção alta da bacia do Rio São Francisco, na região Sudeste, encontra-se com aproximadamente 45,4% de seu volume útil armazenado. Este reservatório tem apresentado importância para esta bacia, que enfrenta sua pior crise do histórico, contribuindo para a manutenção das vazões e das reservas hídricas nos trechos a jusante, principalmente para o reservatório de Sobradinho. Na figura 5 apresentam-se as vazões médias mensais observadas nos últimos meses e, na sequencia, cenários de vazão, em função de cenários de precipitação, para os próximos meses. No mês de Junho de 2018, a vazão média afluente a este reservatório foi de 126 m³/s, o que representa 45% da média histórica para este mês. Os cenários simulados para este reservatório sugerem que as vazões fiquem abaixo da média histórica para os próximos meses, ainda que as precipitações sejam em torno da média climatológica.  Para mais informações da situação atual e projeções para a UHE Três Marias clique aqui

Figura 5 – Projeções de vazão média mensal (em m³/s) para o aproveitamento Hidrelétrico de Três Marias (linhas tracejadas), para os cenários de: precipitação 25% abaixo da média climatológica (azul claro); na média climatológica (cinza); 25% acima da média climatológica (azul escuro); e precipitação igual ao ocorrido em 1994 (laranja). As linhas espessas representam as vazões médias mensais observadas, de acordo com o ONS: histórica (preto); mínimas (marrom); série de dezembro de 2016 a novembro de 2017 (magenta); e de dezembro de 2017 a 04 de julho de 2018 (roxo).

 

O reservatório da UHE de Serra da Mesa, localizado na porção alta da bacia do Rio Tocantins, na região Centro-Oeste, encontra-se com aproximadamente 21,3% de seu volume útil armazenado. Este reservatório vem enfrentando condições hidrometeorológicas desfavoráveis desde 2015, o que vem reduzindo seu volume armazenado e, por este motivo, vem experimentando flexibilizações temporárias da vazão mínima defluente (menor descarga do reservatório). Este é o maior reservatório do Brasil em termos de volume de água (54,4 bilhões de m³). Na figura 6 apresentam-se as vazões médias mensais observadas nos últimos meses e, na sequencia, cenários de vazão, em função de cenários de precipitação, para os próximos meses. No mês de Junho de 2018, a vazão média afluente a este reservatório foi de 231 m³/s, o que representa 64% da média histórica para este mês. Projeções de vazão para este reservatório, utilizando cenários de precipitação, sugerem que as vazões fiquem abaixo da média histórica para os próximos meses, ainda que as precipitações sejam em torno da média climatológica.

Figura 6 – Projeções de vazão média mensal (em m³/s) para o aproveitamento Hidrelétrico de Serra da Mesa (linhas tracejadas), para os cenários de: precipitação 25% abaixo da média climatológica (azul claro); na média climatológica (cinza); 25% acima da média climatológica (verde); e precipitação igual ao ocorrido em 2017 (laranja). As linhas espessas representam as vazões médias mensais observadas, de acordo com o ONS: histórica (preto); mínimas (marrom); série de outubro de 2016 a setembro de 2017 (magenta); e de 2017 a 13 de junho de 2018 (roxo).

5- Previsão sazonal e sub-sazonal para o Brasil

Na escala climática sazonal, o Oceano Pacífico permanece em um estado neutro, i.e., temperaturas da superfície do mar dentro dos padrões normais (nem La Niña, nem El Niño). Entretanto, devido ao recente aquecimento das águas superficiais do Oceano Pacífico Equatorial as chances de que um El Niño se forme durante a próxima primavera são de 50%. Esta chance é quase o dobro da probabilidade associada a um cenário com distribuição normal, a qual seria de 33,3% (Fonte: International Research Institute e Climate Prediction Center– EUA; Bureau of Meteorology – Austrália).

A previsão sazonal de chuva do International Research Institute (IRI) indica uma pequena possibilidade de chuvas acima da média para os estados do Acre e Mato Grosso, durante o trimestre Julho-Agosto-Setembro (JAS/2018). Esta previsão utiliza diversos modelos em sua composição. Nas previsões do modelo Climate Forecast System (CFSv2) da Agência Ambiental dos EUA (NOAA) e na previsão sazonal do CPTEC/INPE não há indicações se a precipitação sofrerá desvios da climatologia ou não.  Portanto, o panorama é incerto e recomendam-se medidas de precaução e austeridade em relação ao gerenciamento dos recursos hídricos.

Na escala de médio prazo as previsões mais recentes indicam condições normais para chuvas nos próximos 15 dias (até 18/07), o que significa dizer pouca ou nenhuma chuva para as regiões de seca severa que aparecem na Figura 1, dado que é o período de estiagem sazonal destas regiões. Em escalas intermediárias (subsazonal) não há indicações confiáveis de influência positiva ou negativa na precipitação sobre o Brasil.

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